"O inimigo existe e não é o cidadão médio"

Publicada em 30/06/2021

Agnes Monteiro da Silva, jornalista formada pela UFSJ

No mesmo mês em que Roberta Nascimento teve seu braço amputado após ser queimada viva em Recife; Maria Eduarda, 22 anos, ter sido morta a tiros no interior do Piauí; e Lígia, encontrado a morte após ser atacada em um bar na cidade de Rio Preto, as cores do arco-íris invadem perfis nas redes sociais, sites e vitrines por todo o país. Aliás, junho é o mês de celebrarmos todas as formas de amor!

As grandes empresas apresentam com orgulho seus colaboradores gays, lésbicas e bissexuais, em vídeos e fotos promocionais, e absolutamente todo mundo embarca nas águas da inclusão e surfa nas ondas do engajamento. Como na maioria das datas comemorativas, também essa vem sendo capitalizada. O que não é de todo ruim, pois traz visibilidade, e visibilidade desespetaculariza nossa existência.

Apesar de tudo, não há motivos para comemorar? Com certeza há. Quebrar as correntes e ser livre para ser quem realmente somos é algo maravilhoso! Não há problema em se orgulhar disso. É chegado, porém, o momento de rever essa história, observando que algumas letrinhas dessa sigla, que engloba muitos de nós, estão ficando para trás. E para além do respeito sobre quem a gente é, para alguns de nós está sendo negado o direito de viver e de existir.

Além da disputa por visibilidade dentro da sigla, existem os obstáculos sociais e espaciais que nos separam dos que mais estão precisando de motivos para se orgulhar. Porque o inimigo existe e não é o cidadão médio, que não sabe e não quer saber a diferença entre gênero e sexualidade, mas indivíduos em evidência e poder, que objetivam o fim das nossas vivências.

Recentemente, vimos um apresentador que voltou a se sentir confortável em atacar a comunidade LGBTQIA+ em TV aberta, mesmo tendo sido processado em maio, pelo mesmo motivo, e absolvido pela Justiça, para a qual o comunicador estava apenas “criticando a comunidade LGBT”. Conquistamos a criminalização da homofobia e da transfobia, mas quem está sendo criminalizado afinal? Há 52 anos, nossa classe respondeu à altura os ataques que sofriam. E cá estamos nós, meio século depois, ainda sob os mesmos ataques. Não é hora de respondermos novamente? Ou devemos continuar assistindo aos mais fracos de nós caírem até chegar a nossa vez?